Em um contexto marcado pelo agravamento da crise climática no Brasil, como o aumento da frequência e intensidade de desastres como enchentes, secas prolongadas e deslizamentos, o governo federal realizou, nessa quinta-feira (31), reunião técnica sobre a revisão do Protocolo Nacional para a Proteção Integral de Crianças e Adolescentes em Situação de Riscos e Desastres. A atividade foi coordenada pela Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (SNDCA/MDHC), em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e com a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (SEDEC/MIDR), na sede do Unicef em Brasília.
O encontro teve como objetivo principal debater a proposta de revisão do protocolo à luz dos desafios impostos pelas mudanças climáticas, com foco na identificação de lacunas, oportunidades de aprimoramento e estratégias para fortalecer a atuação intersetorial. Nas próximas semanas, novos encontros e oficinas de trabalho envolverão representantes da sociedade civil do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e de organizações da sociedade civil com atuação na temática.
A secretária nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente e presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Pilar Lacerda, destacou que crianças e adolescentes estão entre os grupos mais afetados pelas desastres ambientais. “Vivemos uma emergência climática contínua. E, diante da intensificação desses eventos, é essencial garantir respostas permanentes, articuladas e sensíveis às especificidades de cada território e grupo populacional atingido”, afirmou.
Segundo Pilar, a fase do desenvolvimento físico, emocional e cognitivo torna crianças e adolescentes especialmente vulneráveis aos efeitos da crise climática, como deslocamentos forçados, perdas familiares e interrupções prolongadas das atividades escolares. “Essas situações não apenas violam direitos fundamentais, como também ampliam desigualdades históricas, sobretudo para meninas e meninos negros, indígenas, quilombolas, com deficiência, migrantes e de comunidades tradicionais”, ressaltou.
A reunião ainda contou com a presença de representantes dos Ministérios de Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS); da Saúde (MS); da Educação (MEC); da Justiça e Segurança Pública (MJSP); das Mulheres (MMulheres); da Igualdade Racial (MIR); além de representantes de governo do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e especialistas do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH).
Impactos e resposta integrada
De acordo com dados do Unicef apresentados durante o encontro, mais de 40 milhões de crianças e adolescentes no Brasil estão expostos a pelo menos um risco climático, o que representa quase 60% dessa população. Em 2024, mais de 1,17 milhão tiveram suas rotinas escolares interrompidas por desastres ambientais. Somente as enchentes no Rio Grande do Sul afetaram 741 mil estudantes e mais de duas mil escolas. Já a seca extrema na Amazônia ocasionou o fechamento temporário de cerca de 1.700 escolas, inclusive em territórios indígenas.
Instituído pela Portaria Interministerial nº 2/2012, o Protocolo Nacional Conjunto para Proteção Integral a Crianças e Adolescentes, Pessoas Idosas e Pessoas com Deficiência em Situação de Riscos e Desastres foi construído com a articulação de dez ministérios e o Unicef. Diante da intensificação da crise climática e da necessidade de fortalecer mecanismos de prevenção, resposta e recuperação com base na garantia de direitos, a revisão do documento tornou-se prioridade.
Com base na Portaria nº 218/2023, que estabelece o Protocolo de Atuação do MDHC em Situações de Riscos e Desastres, a pasta assumiu a coordenação do processo de atualização do protocolo. A primeira versão revisada foi elaborada em parceria com o Unicef e a Defesa Civil Nacional, e submetida à consulta interinstitucional.
“A resposta às emergências não pode ser improvisada. Ela exige planejamento prévio, fluxos bem definidos, equipes capacitadas e compromisso com a proteção integral em todas as fases da gestão do risco: da prevenção à reconstrução”, enfatizou Pilar.
A secretária também reforçou que a articulação entre áreas como direitos humanos, proteção civil, saúde, educação e assistência social é fundamental para consolidar o protocolo como instrumento de ação pública efetiva. “Não se trata apenas de um documento técnico. O protocolo revisado é expressão do compromisso do Estado brasileiro com o direito de cada criança e adolescente de viver com dignidade, segurança e oportunidades. Mesmo diante dos efeitos da crise climática, é fundamental observar os marcadores sociais da diferença, considerando as interseccionalidades das políticas públicas, com atenção especial a gênero, raça e etnia.
Evento
Na ocasião, o Representante do Unicef no Brasil, Sr. Youssouf Abdel-Jelil reafirmou o compromisso do Fundo em apoiar o governo federal e os governos locais no fortalecimento de políticas de proteção integral de crianças e os adolescentes. O representante ainda destacou a importância de colocar crianças e adolescentes no centro das ações de preparação e respostas a desastres, garantindo seus direitos mesmo em situações adversas.
Durante o evento, também foi apresentado o Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil, evidenciando as boas práticas e avanços empreendidos na coordenação das ações de proteção e defesa civil em todo o território nacional, com o objetivo de reduzir os riscos de desastres.
Ao longo da programação, ainda foram realizados grupos de trabalhos temáticos sobre prevenção e resposta para crianças e adolescentes contra violência e proteção das crianças e desaparecidas e desacompanhadas; gestão de abrigos temporários; monitoramento e gestão de dados; interseccionalidades de gênero, raça e etnia e ações de comunicação e participação.